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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

sob a fuligem esta o azul imovel.

Dentro da incongruência, do sono, do ângulo agudo que
fura sua testa e acaba com o contexto correto, isso tudo aflige, acredite.
Aquelas palavras de profunda sabedoria me imobilizaram, imediatamente,
estava internamente rouca,muda na forma humana e com pensamentos
correntes.Sim.
Eu estava sentada diante de cadeiras azuis infinitas que mal
podia distinguir as que estavam longe demais, como se tivessem
deixado de ser cadeiras apenas por não estarem na mesma distância,
eram manchas, eram formas, bichos ferozes, imóveis a espreita
da oportunidade pra te atacar.
Esse fato me levou a um questionamento tão profundo que me
imaginei desfigurada, se vista muito de longe, sabe, irreconhecível,
a beira de qualquer interpretação fútil. Esse é o risco moral de se
viver na condição humana.
De qualquer forma, eu desconsiderei a possibilidade de tal
transformação das pobres cadeiras, claro, elas não falavam
muito, nem saiam muito do lugar, mas presenciaram o fogo daqueleu er
teatro de uma forma tão silenciosa, devido a isso prestei
respeito. Me silênciei diante daqueles vestígios e de toda
fuligem que ainda estavam nas frestas, nos becos.
Elas sim eram corajosas. E quem pensava nelas?
Na verdade eu comecei a pensar tanto que mal percebi que aqueles
malditos fios haviam tido novos problemas, e como numa briga de
casal ou numa reconciliacao sazonal, pegaram fogo.
Enquanto isso houve gritaria,pois fugiam, pulavam pelas cadeiras e as
chutavam, afinal agora, e somente agora era conveniente te-las
fora do caminho, tamanho egoismo humano.
O teatro estava inundado de chamas,de desespero, de cadeiras e
da composicao carnal e espiritual que tinha o meu nome, simples assim e
eu queria ficar ali com elas, numa sintonia perfeita de silencio
e calor. Esse calor eu nao tinha fazia tanto tempo que sentia
frio ao me olhar no espelho, mas na verdade eu fiquei era
pra entender o que se passava ou pra nao estar no mesmo
lugar dos outros.
Enquanto o teatro novamente pegava fogo, sem que eu pudesse fazer nada,
esperei no canto mais inacessivel, para que as chamas demorassem a
me alcancar. Sei que um dia tal segundo chegaria, seria longo,
mas entao sim, quem sabe eu fugiria tambem. Ou nao.
O pior mesmo nao era o que estava ali dentro, mas sim o que aguardava
la fora do teatro: pessoas. Naquela irracionalidade momentanea eu levantei
e sem perceber deixei cair meu caderno com anotacoes sobre todo
meu devaneio, me culpei para sempre e me surpreendi, ao abrir a porta
e encontrar todos caidos. Caminhei tranquila, nao fiz questao de olhar
para traz, a cada passo meu passado se desvanecia, mas as anotacoes que
inclusive nao revelei aqui ficaram fixadas dentro das cadeiras corajosas,
cobertas de fuligem, quem sabe um dia alguem que mereca le-las descubra meu esconderijo, minha perda proposital, pois naquela noite eu descobri um segredo, e talvez so quem seja corajoso e consiga compartilhar o silencio deva saber.



(...)

Obs: Nao sei se esse texto acabou, cada personagem e imortal a partir
do instante que nasce nas entrelinhas,mas depois de umas frases eles ja conseguem
transitar sozinhos e construir suas proprias historias, quem sabe se essa
personagem me contar da continuacao, eu relate novamente.

domingo, 25 de julho de 2010

T.

Um dia, eu sabia que isso aconteceria e de qualquer forma me punia antecipadamente
com essa dor. Olho para traz e não a veja, nem sinal, nada.
Se eu soubesse que seria assim, que seria nessa semana, aliás, o que eu teria feito?
Já se perguntou alguma vez, ou quantas vezes? O que faria se soubesse que dentro de três dias uma desgraça de ocorreria? Não, você não vai perder sua vida, não esta que está aí dentro que te faz chacoalhar os ossos, mas uma parte da razão pela qual você sorri e segue adiante todas as manhãs, aquilo que nos dias chuvosos vem te encher de carinho e te fazer sentir especial. Alguém, algo, o que seja, sim, você irá perde-la dentro de três dias, e o que faria? Pois bem, eu não sabia o que estava por acontecer, talvez por isso não tenha feito nada, embora os pressentimentos já tivessem tomado conta de mim há muito tempo, sussurando as tragédias, relampiando no meu céu azul, traziam chuva, vendavais e lágrimas de orvalho pela manhã.
Mas eu absorveria seu cheiro, profundamente, encheria meus pulmões com ele, de forma que levaria uma eternadidade para meu corpo se desfazer de sua essência, eu te costuraria em mim, de modo que fizessemos parte do mesmo corpo, iamos cicatrizar juntas, e talvez eu evitasse sua doença com minha sanidade física, por enquanto.
Vamos, arranhe a minha janela para que eu a abra, venha compartilhar essa solidão comigo, que só preciso de alguém pra contar alguma desgraça. Isso me bastava e era tudo que eu pedia, seu silêncio e seu olhar cheio de sentido contido, a cada respiração.
Não tenho mais motivo para olhar para traz, de uma vez por todas. Não há mais nada no telhado, além da minha vontade de jazer lá em cima, até que eu te encontre novamente e você me leve para conhecer seu novo palácio.
Mas saiba, onde quer que você esteja, de qualquer maneira, sempre e sempre você será a dona da minha janela, onde irá repousar e dormir eternamente. E agora, eu lhe peço, ultrapasse as barreiras dessa realidade mórbida e contemple o que eu sempre sonhei enxergar, sendo um esquilo ou uma raposa.
Essas lembranças pertencem a você, você se despediu sutilmente, agradeço. Foram doze anos, foram longas histórias. Não precisa voltar pra me contar como é, não precisa ao menos me dar sinais, eu vou reaprender a sorrir sem você e aprender a aceitar a saudade como se fosse uma estação do ano, inevitável.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O vislumbre do nada

Antes de ler este texto feche os olhos, vislumbre um local inteiramente branco, embora não se possa enxergar nada nesse cenário além da imensa fila de humanos, um tinteiro, uma pena e um pergaminho se pode ouvir nitidamente o barulho do mar. Nossa personagem Mathilde está prestes a assinar sua morte, dentro de instantes ela deixará tudo que representa fisicamente e todas suas memórias, porém um fato a faz escrever nas entrelinhas do seu fim. Algo para ficar para sempre registrado, por mais que ela não possa mais ser encontrada no infinito.


Não vejo motivo aparente para desconsiderar meu óbito, estou aqui prestes a assinar o contrato que anula minha existência e não vejo um porque para desistir.
Antes disso traço uma breve história nas entrelinhas deste pergaminho malicioso, e vejo o último vestígio que tive de mim antes de me encontrar em tal situação, vou descrever e ser bem breve, afinal tem uma fila pendente de corpos prestes a se despirem de suas vidas, bem atrás de mim:
Era uma noite em que se caíram varias estrelas, por causa disso meu sorriso se iluminou seguidas vezes, diante dos abraços e beijos miraculosos que causavam singelas sensações de taquicardia dentro do meu frágil peito, nada parecia acabar e suas mãos gelavam como a morte que sinto roçar em meu pescoço agora, talvez por isso eu a queira tanto, pois ela me lembra teu toque naquela noite serena de brilho imperial. Tanto foi prometido, e tão nada cumprido, não tivemos tempo e eu não tive vida para tanto comprometimento, me fui antes que você pudesse decidir por qual caminho seguiríamos.
Me deixaste em casa e acreditaste que assim eu estava segura dentro desta concha submersa, neste planeta que eu criei, inventei pelo meu e egoísta bem, embora, possa ter certeza, isso nunca me levou muito longe, a não ser dentro dos perímetros do seu lar, docíssimo e caramelado lar.
Pois bem, mal acreditei que minha alma por si só já vivia ausente de mim, descontrolada sozinha ia para onde bem entendia, e eu? Essa é uma excelente pergunta e nesse instante que me desespero, te conto.
Penso que durmo, penso que faço zilhões de coisas e na verdade, onde estou? Afinal, não sei. Cá estava eu, assim, dormindo, tranqüila. Eis que num tempo desconhecido pelos ponteiros e todos relógios estilhaçados, este corpo que em poucos segundos se abandona, se levanta.
Sim, lá estava eu, andando pra lá e para cá. Mal pude acreditar que eu, alma, estava de lado, a pura essência ignorada e humilhada por ossos e músculos que iam se decompor em menos de um mês. Tudo bem, o que fazer quando já não se tem controle nem pra gritar: Pare, o que você esta fazendo? Vai acordar todos dessa casa!
Mas não. Continuou ali, procurando sabe lá o que, mas tudo bem, no final das contas esse corpo pelo qual eu de forma alguma quero me responsabilizar e que é conhecido por meu nome neste mundo, conseguiu acordar sua jóia mais preciosa, uns minutos mais tarde consegui tomar o controle da situação e envergonhadíssima comecei a pensar nas desculpas mais plausíveis pro acontecimento. Foi único, eu alma fugi do eu corpo poucas vezes, mas essa sem dúvida foi uma das mais memoráveis e engraçadas que eu fiz questão de relembrar e escrever aqui, no cantinho dessa folha que decreta meu fim, sei lá como, sei lá qual. A verdade é que nunca soube muitas coisas na vida, dessas que se fazem a total diferença, mas eu estive certas nos momentos mais importantes, como agora. Olho para traz e vislumbro todos que partirão comigo, somos donos nos nossos próprios barcos, sem nenhuma tripulação, perdidos num instante sem nome ou melhor, finalmente encontrados dentro dum universo muito maior e significante, dentro de nós mesmos.
Ri sozinha na fila, e diante de mim tinha um espelho, me lembrei de como era bom sorrir, e pensar que daqui uns segundos eu já não seria dona desses lábios e dentes.
Aliás, daqui um segundo todos desta fila poderiam ficar amontoados, uma transparência sobrepondo a outra e nada, exatamente nada apareceria diante de nós, não seriamos mais algo que pode-se ver e sim o que iríamos transmitir dali pra frente, em algum lugar, algum mar(...)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

C'est ça!

E toda manhã, ou quase toda eu penso na música do Chico Buarque, mudando o horário,
mas a conclusão é a mesma: Todo dia eu faco tudo sempre igual, me sacudo as 7 horas da manhã! - Enfim, é bem assim mesmo, o Frank que o diga.
Logo de manhã, desbravamos as neblinas e desviamos de imensos dinossauros a motor,
desde os carnívoros até os herbívoros de apenas duas rodas.
Isso é sempre. Ainda não arriscamos outro caminho, ainda, mas breve
com certeza tentaremos algo, quanto o tempo for esparso o suficiente pra isso,
afinal antes de tudo tenho o compromisso de apoiar o dedo e aperta-lo no
identificador de digital exatamente as 8:00 da manhã a não ser que eu morra
ou seja abduzida.
Depois disso divido as seis horas em duas de três, e assim vai e vai, durante o dia eu faco tantos comentários aleatórios e gostaria muito de escrever todos, como se fosse uma eterna narracão sobre eu mesma.
Quem disse que peixe não gosta de rede? Eu como pisciana adoro uma rede semântica, fazer eternas associacões ligar o mundo todo ao que faz sentido pra mim, ou mesmo aquilo que não faz muito sentido na prática, realidade, vida desumana, mas ao mesmo me faz raciocionar e unir várias coisas interessantes que desembocam num só mar. Tanto mar. Acredite, eu posso inundar vários textos, cheios das associacões, quem sabe não farão sentido, mas pra mim, o que importa é que elas nadam.
Bem, quando eu penso que encontrei algum tempo pra escrever algo mais demorado,
como se eu apreciasse um capuccino com alpino derretido no fundo, mas não, me sinto esmagada pela hora que a cada segundo me lembra que é um segundo a mais de sono sem um piscar de olhos diante dos números, sim, números infinitos.
Mas me diz: Você acha que estou reclamando? - Não diga que acha, pois isso pra mim
é na verdade maravilhoso, pelo único fato de ser a única vez que vou viver cada
instante desse, faco inclusive apologia a menos sono, mas ao mesmo tempo a mais sonho, e enquanto isso se contradiz aqui nos ponteiros do relógio, eu conto é as horas pro outro dia chegar e tudo comecar de novo e de novo. Boa noite.




Fato: Este texto é meramente pessoal. Mescla ilusão com percepcões diárias de quem
no momento, breve e único está com sono.

domingo, 11 de julho de 2010

Parachuva,paraline.

Só era mais um maço de papel que ia pro lixo, em vão e frustrado por não ter concluído seu único propósito pelo qual existia até o dado momento: ser lido.
Mas quando decidiu ligar sabia que de fato seria melhor, ela entenderia bem sua confusão, aquela que jamais poderia ser expressa naquelas dezenas de maços.
Matilda esperava a cada chamada, seu coração palpitava apreensiva com medo de não ser atendida. Mas sim, logo Allen atendeu e puderam iniciar toda uma discussão, um desabafo, ou sei lá o nome que isso poderia ter, e se mesmo iriam chegar a algum consenso ou atitude diante dos fatos que se desenrolavam e destruíam lentamente sua descolorida vida.
Algumas coisas não iam mudar nem com o passar de mil anos e por isso elas ainda se entendiam tão bem, mesmo quando o silêncio pairava por longos minutos, ainda assim Matilda se sentia imensamente acolhida, embora estivesse há muito tanto contemplando tamanha solidão, mas não naquele momento. Só me entenda assim, sem dizer nada, que eu sempre saberei que está é a forma concreta do entendimento. Feche os olhos para que possamos realmente ver, pois a cegueira humana é inútil diante das cores de dentro da nossa mente. Era só assim para se encontrarem já que eram milhas e milhas
separando a carne humana, de abraços e risadas que só as melhores amigas do mundo poderiam dar.


(...) continua

terça-feira, 1 de junho de 2010

Gelatina

"Quando mil seres gelatinosos e imaginários se encontram diante
dum lindo navio, em busca das respostas do outro lado do continente
se deparam com um imenso descontentamento ao, preencherem seu formulário
de passageiros: não saber ONDE SE ENQUADRAR e nem o que responder em
alguns itens. É neste cenário que esse texto é desenvolvido, em alto
tom, gritante. No final, tudo gela. É o fim chegando depois de perderem
o total interesse em responder, tamanha exigência imposta pelo mundo,
tamanha tristeza em mal se conhecer. E gela."


Quando não é possível se enquadrar em nada disso aqui, a gente para, respira
fundo e visto que isso aconteceria de qualquer forma, por ser um
ato involuntário, continuamos a respirar, sinceramente, de nada adianta.
Continuaremos eternamente desenquadrados. Fim. Identificar o problema,
muitas vezes é reconhecido como ter em mãos 50% dele resolvido, fácil
assim, fácil demais se for pensar. Aliás, pensar é fácil. Além de tudo
agora temos a certeza de que 50% está ali resolvido, sem quase nenhum
esforço, somente o mental, que muitas vezes, sempre a mil, nada exige.
Silêncio profundo na mente ativa que suplica, suplica, até que nos
ataca de tanta raiva, por ter suplicado mil vezes, sem ter sido atendida
nenhuma delas. Eis 50% caindo, pesadamente na nossa realidade.
É hora talvez da ação, pra se enquadrar? Pra agir sem um propósito
importante? Por não ter muito o que fazer? Jamais vão saber.
Toda ironia é composta de cicuta e escuta aqui, já que isso é realmente
eficiente, já que tudo isso faz diferença, calcularia
friamente uns 100% de resultado,bem melhor do que os 50%, ali em cima exposto,
jogado, retalhado que brevemente vai servir mesmo é de adubo,
por não ter adiantado merda alguma. Mas tudo bem, é com essa tal
ironia eficiente que eu proveniente da dúvida, da angústia das
incógnitas, venho aqui, misericordiosamente pedir: Onde enquadrar?
Me enquadrar? Me derivar? Me espalhar? Melenas ao vento, e fugir não
é pecado, a não ser quando o pecado proveniente no rio de Hades,
dos frades, ah, dos frades, daí se torna imensamente pecaminoso,
mas tudo bem, chega da irônia escondida nas melenas, nos girássois,
desse rio seco que só traz o nada, nada traz. Melancolia. Diga
alto pra fazer parte do universo audível do seu dia, mais e mais
alto, até que isso vai se expandir de uma forma, que vai se tornar
nulo, de tamanha loucura. Tamanha loucura. Escuta aqui, o que você
vai, absolutamente, diga, absorver disso?! Não é uma estóriazinha
esotérica que você vai achar no rodapé de alguma página, é uma carta,
uma despedida, estilo aquele momento em que se abana um lencinho
num navio. E a última coisa, e nem por isso menos importante,
que todos esses seres imaginários e gelatinosos querem saber é
onde irão se enquadrar, por favor, uma resposta breve, e nem por
isso demasiadamente concisa mas altamente explicativa, neste
instante, sim? Silêncio. É isso que se tem. Prepare seu lencinho,
suas libélulas acenadoras, entrem no navio e continuem com a dúvida,
os 50% de entendimento do problema não levou (não) a resposta, então
aqui senhores e senhoras, cicuta, para todos vocês, vocês aí,
gelatinosos. Agora sim. Tenha aí, 100% de diferença feita,
com massa fina e eterna. Depois disso, queridos passageiros,
aguardem o silêncio mórbido e eterno nesse ensolarado dia
de não-enquadramento. A dúvida não mata o corpo que fica mas
acompanha a alma que vai e gela.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

E o fim?

Isso, não tenho nada a dizer definitivamente nada. Entretanto estou dizendo
tudo que está contido dentro de um silencioso "nada".
Pensar em "nada" faz com que eu visualize um vácuo, uma eternidade,exatamente isso: o próprio infinito,dito e materializado.
Porém isso nos engole, isso acaba com o mundo inteiro que circula
em partículas minúsculas ao redor de nossa mente, logo o "nada"
supostamente vazio, trás várias coisas inquietantes que de vazias
não tem nada, mas de esvaziadoras tem tudo.
O nada reside numa extreminade alerta, ao abrir a porta poderemos encarar o infinito no limiar, assim, de olhos esbugalhados, indignado com tudo que o nada
te suga, te reprime e te esvazia, sem dó nem piedade.
Pronto, eu situei o "nada" num contexto e percebi que numa
carta vazia, tem muito mais escrito do que em mil volumes daqueles livros extensos.
Tudo bem, compreendo também que o "nada" está carregado de palavras invisíveis,aquelas ainda não traduzidas e também aquelas impossíveis de compreender.
O "nada" vem escrito num pergaminho com a descrição da morte, sim, ninguém nunca vai saber ao certo, mas quem sentiu provavelmente entregaria umacarta "vazia".
Vazia que nada, cheia de nada escrito, cheia daquilo que ninguém entende, e nem por isso é vazia, não é nada, é tudo.
Esse limiar que é quase nada, o nada e o tudo estão quase se fundindo e ninguém nota, ninguém anota os passos delinquentes que esse limiar devia dar por aí, então enfim, o nada e tudo formariam algo:________.
Isso que não se tem nome, não existe diante dos seus olhos, dos olhos da multidão humana, que grita em protesto por uma explicação.
Mas quando chegar o momento, eu vou explicar detalhadamente,
vou distribuir por aí mil cartazes em branco, e ai de quem
disser que eu não escrevi nada, que eu proclamei o vazio
em suas paredes pulverizadas da camada fina de chuva que caiu
ontem a noite e ainda não secou.
O que você não vê, certamente existe em algum lugar, dentro de algum quarto branco, e poderíamos até supor que ele está vazio, solitário,e obstinado em ser, existir. Enfim, queremos qualquer coisa para que possamos nomear e publicar por aí, eis O QUE É, O QUE TEM NOME, O QUE EU CONHEÇO. Mas não conhece nada, não sabe de nada, e isso é tudo.
Então depois de horas pensando, desde que o sol arrancou a janela
do meu quarto e me obrigou a acordar até agora, eis que cheguei
numa conclusão: Não há conclusão. Nunca haverá e essa será minha eterna prerrogativa, jamais terminará.
Por isso que do nada, eu vejo o infinito, só preciso abrir a porta
para observar , nem se eu tivesse mil braços ou milhões eu alcançaria o fim, nem assim, nem daquele jeito e nem do outro.
Por isso, só e exatamente, eu continuo sem nada a dizer,
se ao menos eu conseguisse expor de outra forma, mas a forma ainda não existe, não assim, nesse mundo, desse jeito ou daquele jeito.
Na verdade eu começo a crer que nada existe, pois nada alcanço,
logo tudo faria parte do infinito, que fica no limiar com o nada,
isso é tudo. E o fim?

terça-feira, 4 de maio de 2010

Primavera


Emperrada na nascente florida onde ela guarda as
mágoas amadas. Assim estava Marga.
Não começou ali, mas certamente foi ali que foi visto,
pobre ser sem identidade moral, carregando duas
pedras, pedras que desceriam garganta abaixo
afim de conter algo,talvez de preveni-lo contra a realidade
que fazia com que ele se odiasse cada vez mais.
Difícil de compreender a identidade da alma, quando
essa mesma não quer ser entendida.
Yan descia a rua de sua casa, certo de que no fim
seria punido por algo que naturalmente ele teria
feito, mais uma vez estaria arrependido, porém
jamais estaria convicto de que não o faria de novo,
seja qual fosse a punição, nem que fosse cada vez
mais severa.
O importante era ser desculpado, para logo poder
pecar novamente e assim, nesse rosário concluir
uma procissão inteira de dores.
Marga o observava, ali, no limiar do seu sonho
e também do seu pesadelo. Ela nada podia evitar,
pois afinal, a culpa era dele, de toda essa
imaginável situação.
Ao mesmo tempo se sentia incompleta, ele fazia
parte do seu processo evolutivo nesse plano confuso,
ele era o reflexo dos seus sonhos inacabados, ele
era o pesadelo que ela não vencia, cujo desafio
era sempre maior que o propósito da luta.
Correu em sua direção, Marga correu tudo que pode
e enfim o parou, afobada e quase sem ar.
__Yan, você sabe muito bem aonde ir,sempre soube.
Como encerrar um caminho percorrido por tantos
dias?! Eu posso te contar a nova versão
dessa história, cujo fim eu acabei de inventar.
Yan parou, se indagava mil vezes, mil perguntas,
mil sinos tocam e uma única Marga, pálida e
invernosa, seu casaco azul estava salpicado
de neve, onde estaria Marga nesse verão?!
Da onde surgiu e em que tempo habitava?!
Queria entender se não estaria delirando,
se estaria finalmente temeroso de sua punição
e convencido de que jamais pecaria, pararia
de vez ou seria arrastado para o mundo
gelado de Marga?! Sim. Finalmente.
Yan nada disse, nada verbal, aquiesceu
lentamente e uma lágrima rolou de seu
olho esquerdo, seu único olho humano.
Nesse instante seu olho de vidro trincou,
e escorreu o que podemos considerar
como sendo uma lágrima de sangue.
Marga observava tudo em silêncio, seria essa
a noite em que estaria completa? A noite
em que salvaria Yan de seu pecado, seu mito.
Yan colocou as pedras no chão,deu sua mão para Marga,
a mão dela estava fria, frágil. Então disse algumas
palavras que soaram como uma ofensa para Marga:
__Não entendo. Está verão e seu casaco está
cheio de neve. De que diabos de lugar você veio?
Ele não entendia.Ainda não. Ela refletiu
bastante antes de responder, soltou a mão de Yan,
que a olhava assustado:
__Você vive o verão pois ignora o inverno.Não
importa o quão gelado esteja o mundo, você
simplesmente não se importa, despreza os flocos
de neve que caem diante do seu nariz, afinal
o que importa é você fazer o que você quer.
Mas afinal, quer ou não conhecer a verdade?
Por alguns segundos Yan se sentiu seguro o suficiente para
revidar a resposta de Marga, porém parou, ele não
sabia o porquê de tudo aquilo, do mesmo caminho sendo
percorrido, da mesma sensação de glória ao ser excluso
do erro e disse:
__Eu já posso sentir o frio.
Marga ficou mais aliviada, ele aceitou segui-la de uma
forma singela. O destino seria o bosque, a solução
seria encontrada, ele não mais pecaria, ela não
mais estaria condenada a nascente florida,
a questão era escrever nas notas, rodapés,
nas paredes, nas flores. Seriam distribuidos
recados por todos os lados, as letras formariam
cirandas e mais cirandas, após isso eles deviam
apenas ler, em voz alta, invocar o final tão
desejado e por fim vivê-lo, transformado e digno.
Quem sabe dessa forma a primavera pudesse enfim chegar.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Peixe alucinado.

Sem inspiração, desejei três minutos de alguma música que eu gostasse.
Era tarde, era noite, tinha alguém aí, em volta muitos buscavam
me dizer coisas mas não deixei,não! Não pude conter
a esperança que assolava meus sonhos amargos de solidão,
eu sabia como resolver mas não agia de forma coerente
com as ideias, com as pistas jogadas no asfalto.
O chão podia se abrir, eu ia entrar na terra que logo
se fecharia, as mãos tremiam juntamente com
todo o corpo. É desconhecido e perturbador,
eu estava me livrando aos poucos daquilo
que eu não sabia ao certo como definir.
Eu sei o que não me pertence e certamente
não lutarei pelas sementes que derrubei no chão,
afinal foi tão sem querer que meu corpo mal
podia aceitar a incoerência dessa atitude.
Eu me espreguicei de maneira tão estranha,
convicta de que não era somente eu,
habitando mente e corpo de forma
tão inconstante.
Responda por mim, pois eu sei que há
tempo essa voz não é só minha.
Me senti desafiada e vilipendiada, não sei por quem,eu?
eu achava o máximo aquela situação:

Se buscando no espelho.
até me perder no reflexo,
onde eu pensei que iria me achar.
Não vi nada, vi você, vi o outro,
mas cadê eu mesma?! Estava andando
por ali, distraída com alguma coisa
que eu não entendi mas que busquei,
incessantemente.
Vocês me olham, sorriem com o canto
dos lábios que arroxeados mostram
o que as águas foram capazes de causar,
eu posso ver suas escamas mau feitas,
não são peixes, mas se tivessem se tornado
antes da morte, certamente iriam se salvar.
-Deus lhe salve da próxima vez! - Eu gritei
do fundo da rua que eu via pelo espelho
e certamente não atrás de mim,
essa rua que só existia do outro lado.
Essa rua não era minha, tampouco feita
de diamantes. Tire suas tripas pelos
olhos, vocês já estão cegos e delas não precisam, tire esse peso de pseudo-vida e me tragam
de volta, agradeço pela rapidez.
Vão louvar todo esforço inútil,
eu não sinto isso, eu posso ser tudo menos eu mesma.
Maldito dia em que dormi com o espelho desvirado,
pude ver os tentáculos, os risos e o espetáculo feito.
Pura libertação. As pernas se dividem em mil,
o corpo não pode mais resistir. Pena ou glória?
Devo me virar e sair andando, sem saber
como eu vou chegar, somente em mente,
aquilo que se mente mas se guarda como
segredo. Eminente olho de cristal. Pontual
cai na madrugada te ignoro e te amaldiçoo.
Em poucos dias o olho apodrece, enfim, volto a dormir.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Conflitos internos onde não há interior

Não me lembro ao certo do que imaginei ao ser engolida pelos lençóis de minha cama, a luz já estava apagada e então milhões de pensamentos me tumultuaram a mente, que aflita permitiu que todos se organizassem da maneira que julgassem conveniente.
Era a história de uma menina, a nomeie como quiser, certamente algumas pessoas possuem uma face parecida com a dela, ou não, mas hoje eu a chamo de Alena:
Alena corria desesperadamente em busca de algo que não se via, apenas se sentia ou se percebia palidamente nas dobras das páginas do dia-a-dia: seu sonho. Me lembro nitidamente de te-la visto sendo empurrada pelo seu sonho mais bonito, sem imaginar qual seria a explicação ou motivo, eis que ela caiu num abismo tão fundo, sem nem ao menos ter a chance de pensar: Que bom que nos encontramos! Antes tivesse apenas quebrado as costelas, ou morrido de forma que preservasse todo seu 'eu' dentro de si, porém caiu bem em cima de uma estalagmite que perfurou de fora a fora seu coração, logo seu sangue fluia incessantemente
pelo chão, ele que continha tanta vida e agora estava ali deslocado num território que não era seu, aquele chão frio e sujo. Agora ela estava livre do cárcere do corpo, verdadeiramente ela, sem dúvidas, sem face,
sem cor e sem limitações. Olhou para seu corpo, o definia como uma capa velha e apertada, da qual a muito tempo precisava se livrar, ele possuia cores tão bonitas, mas cores que não foram capazes nem por um segundo de garantir a felicidade do seu ser. Alena sempre acreditou que seu sangue era áspero e cinza, ao contrário do que via agora, vermelho e aveludado. Para ser tão infeliz, só podia correr algo igualmente triste pelas suas veias, mas não. Essa é a prova real de que as cores não dizem nada, não traduzem uma palavra se quer de nossos sentimentos e só servem para auxiliar o trabalho leviano do puro fingimento. Ela também acreditava que mais cedo ou mais tarde o que pulsava e a supostamente garantia vida, ia matá-la, aquele líquido áspero logo ia rasgar suas veias e apodrecer no limiar dos músculos com a pele. Tudo isso seria causado pelo único fato explicável: Sua alma se debatia violentamente por sua liberdade.
Alena observava seu corpo com atenção, sentindo imensa mágoa. De qualquer forma precisava fugir antes que seu sonho, agora pesadelo, a encontrasse. Por isso deslizou agilmente por entre as fendas do fundo do abismo, deixando para trás o que durante vinte e cinco anos chamou de "eu".
Era difícil tentar entender o que estava acontecendo, agora não havia uma estrutura para qual olhar,
estava ansiosa para encontrar um lago, um espelho, algo que permitisse com que visse seu reflexo, mas reflexo do que?! Aquela estrutura conhecida por todos já não existia, nem braços nem pernas sustentavam seu ser, ela estava invisível para o mundo dos mortais. Se sentia desprotegida. Enquanto andava pelas frestas pensava em assuntos como a felicidade, pronto, agora estava privada de um corpo mortal, estava livre e ao mesmo tempo aprisionada pelo medo de ser encontrava pelo seu pesadelo. O que ele faria?! Olhou para o alto e viu uma parte elevada, lá em cima havia uma pedra, imediatamente se lembrou de Sísifo. Quem sabe a contradição impere, se o seu sonho virou pesadelo, quem sabe aconteça o contrário agora, ou talvez a aplique um castigo eterno, como aquele recebido por Sísifo. Mas castigo pelo que?! Infelizmente não apreendeu as memórias do seu ,até alguns minutos atrás, corpo. Logo não sabia o que havia errado, pelo menos estava livre de qualquer lembrança anterior a isso tudo. A única coisa que lembrava era de sua queda, justo a pior lembrança, a do fim. Queria voar e qual seria a graça disso já que não tinha rosto para sentir o vento?! Era um nada pensante, um protesto mudo, uma essência sem sentido, não havia definição. Ficou parada. Alena fez o caminho de volta, não havia pra onde seguir, voltou pra perto da estalagmite, permaneceu ao lado de seu corpo onde havia uma tênue esperança de recuperar algumas lembranças, estava aflita por não ter sobre o que pensar. Observou a luz que emergia
do céu, tão distante. Sentiu a presença de algo, era seu pesadelo, ele estava exatamente do seu lado. Ela só podia senti-lo, se sentia observada por olhos invisíveis mas ele era tão real quanto ela, tão parte dela como qualquer outra coisa. Seu pesadelo também pensava:
Porém não havia o que fazer para causar qualquer mal em Alena, nada fazia sentido e a ausência de um corpo e até mesmo de um propósito, anulava qualquer possibilidade de atitude.
Todos se sentiam loucos, todas faces que Alena guardava. Seu pesadelo bem como seu sonho, era só mais um inquilino de seu corpo humano. Admita Alena, você já estava fragmentada antes de ser empurrada, não é mesmo? Se dividiu em sonhos, pesadelos, histórias e frases, espalhou seu conceito de liberdade nas paredes e em tudo o que pode exteriorizar, só não conseguia exteriorizar o principal, você mesma. Admita que era esse seu sonho e não seu pesadelo,não o faça se passar por mal diante dos olhos alheios, e admita também que o medo de encontra-lo te fez transforma-lo em algo temido. Alena consentiu, levitou até a parte superior do abismo, onde pode passear pela floresta. Traçou um caminho longo, tomou fôlego e se perguntou se ainda podia respirar: Respiro diante da eternidade e inspiro a cada passo partes do mistério que é existir no desconhecido.

domingo, 4 de abril de 2010

?

Nada é do jeito que eu traço nos papéis, nas folhas que encontro por aí,
aquelas que sobram nos cadernos, aquelas que ninguém se lembrou
de usar. Nada é uma palavra constante e inconstante, mostra o vazio
e nos faz lembrar do que esteve presente. Eu tenho tanto a dizer.
Eu não aceito, mas tenho que viver no meio do caos, o que eu crio
e o que eu vejo sendo criado pelos outros.
Eu vejo o mundo de forma desfigurada e errante, me incomoda
fatalmente, vivo nele infelizmente.
Minha cabeça se abriu nesse exato instante, tudo que estava
guardado em vez de se esvair, entrou em choque com a
realidade sórdida, esses pensamentos se embaraçam de medo,
de forma alguma querem aderir a isso. Eu não aguento, nem
eles, nem os mundos paralelos onde eles se enroscam de vez
em quando. Todo dia vejo isso, vivo isso. Não quero, não quero
estar presente no momento exato da vertigem.
Desfaleci no instante em que notei o erro, eu e nada mais.

Feixe Ferido

Não é a dúvida e sim a certeza, eterna campeã, fumaça, fantasma que ronda e rói.
Um feixe se abriu no escuro, outro feixe de luz, feixe de fumaça, feixe de certezas
que se alastrou e feriu.

sábado, 3 de abril de 2010

La rue et moi


Eu começo assim, no começo da rua, podia ser a metade pra qualquer
outra pessoa mas eu determino onde estou e que nome vai ter.
Fiz a releitura dos paralelepípidos por onde corremos,fugimos e andamos
diversas vezes,ora em passos rápidos, ora em passadas lentas e calmas.
Isso me trouxe à tona diversos pensamentos e cores vivas, apesar do
escuro da noite e de dentro de mim.
O percurso até a minha casa seria curto mas de certa forma seria longo,
essa é uma contradição admissível. Eu ia passar por lugares cheios de
histórias nas entrelinhas, a releitura continuava no asfalto e até minha
casa existiam muitos momentos grifados.
Eu os decorei de tal forma que agora esses versos fazem parte de mim,
ou seria eu deles?! Talvez tenhamos virado uma coisa só, e a releitura dos
lugares passa a ser a de mim mesma. Revivendo tudo, e bem na
esquina no ponto onde saio da rua escura para a claridade algo
prende a atenção, é , sem dúvida, o palco aonde eu deveria declamar.
Mas esta perto e também longe, não considerando a manhã que passou,
mas a noite que acabou de cair, num azul tão entorpecente que se
confunde com outros azuis aveludados, aqueles que as árvores parecem
adquirir no meio dessa escuridão parcial.
Continuo relendo, página por página de mim, num silêncio absoluto que
esses paralelepípidos e seus ruídos não podem perturbar, nem
fazer qualquer efeito.
No bolso um presente, numa embalagem dourada, estava prestes
a escrever outra frase nas linhas dessas ruas, mas vou deixar pra domingo.
Reluzia com as luzes dos postes. Eu visualizava as próximas páginas e
me aproximava de casa, já podia avistar o portão.
Eu sabia que a partir do momento que entrasse o tempo pararia, talvez
eu continuasse a folhear essas páginas mais tarde, pausamente, relendo
aqueles versos e até mesmo parágrafos inteiros. Quem sabe eu até
vivesse mais, pra poder reler depois e depois.
Quanto ao presente na embalagem dourada já posso vê-lo,
resplandecente e provavelmente grifado nas páginas que estão por vir.



Fim.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Caixa de música

Tudo que nos teletransporta num pote de vidro transparente pode quebrar no meio do caminho, sem ao menos termos tido a chance de chegar. Todos sabiam disso, as chances de tudo evaporar eram claras e jamais foram excluídas daquele caderno gigante de possibilidades, por isso mesmo ela se dedicou ao máximo para entender. Depois de longos três minutos examinando e cacando motivos em sua mente, descobriu que tudo era inútil e que a única coisa que ela poderia entender era alguém que todos os dias ela via, diante de um espelho: ela mesma. Nada e nem ninguém mais. Depois caiu num sono profundo, do qual não fazia muita questão de acordar, enquanto isso sonhou e pesadelou durante quatro horas:

Havia deixado de ser humana, coisificada num mundo estranho. Estava tudo escuro demais pra perceber o que havia a sua volta, tocou em algo que parecia ser uma parede e seguiu, sem temer. Quem sabe o chão logo sumiria abaixo dos seus pés, quem saberia o que ela iria encontrar? De alguma forma só ela saberia, pois não seria nada que ela já não havia sentido ou visto já que seu inconsciente pode esconder muito mais do que todas as pessoas que haviam aparecido na sua vida. Pessoas são estranhas. E o inconsciente era um mistério oculto nela mesma, finalmente o chão sumiu, e sinceramente não foi uma surpresa. Então estava numa sala, gigante e clara. Inundada de um líquido cintilante, em todas paredes haviam quadros de musas adormecidas, criando forcas para fugir. Forcas de algo maior e desconhecido, algo que transmitia vibracoes ruins pra toda sala. Porém, bem no meio havia uma musa quase pronta, já havia passado por todas etapas de sua criacão; da pintura se tornou relevo, e do relevo atirou seus bracos pra fora do quadro e escapou, estaria pronta pro seu propósito? Talvez sim, mas ainda estava sem forca pra andar, ela não ousou olhar no rosto dessa musa, que estava com um vestido roxo vibrante, havia medo. Ela sabia que sua presenca havia sido percebida, entao as musas dos quadros abriram os olhos, e a juncao do ódio de todas deu forca para a musa de roxo vibrante que instintivamente olhou pra trás. Ela não tinha rosto, qual seria sua identidade? Estariam relacionadas de alguma forma? Jamais saberia, e logo saiu nadando daquela sala maldita, que por mais luz que estivesse contendo, emanava as piores sensacões. Era perturbador. Mas pra onde fugir, estava dentro de si mesma, tantas vezes precisou repetir pra acreditar, que os limites de seu corpo continham mais do que ela podia deter, seu medo escorria pelos olhos, lágrimas das quais ela jamais se livraria, pois logo secariam em seu rosto e lá estariam absorvidas novamente pelo corpo estático e frio.

E assim acordou, aflita. Havia fugido da sala em seu sonho, mas com muita dificuldade e colocando tanta forca nisso que seu corpo teve que acordar. Era essa a razão, o motivo pelo qual estava se sentindo tão fraca. Levantou e foi até a geladeira. Algo estava acontecendo, sentia seu coracão apertado. Agora estava curiosa com o que se passava naquela sala, queria entender melhor, queria poder salvar aquelas criaturas dos quadros, talvez todas juntas formassem algo bonito e livre. Olhou para a gaveta, no silêncio ao redor encontrou a chave afiada para sua dúvida: era uma faca nova, jovem e tão pouco usada até então. Decidiu que abriria seu peito e encontraria esse mundo que a assustou tanto, tiraria todo ele dentro de si, libertaria as musas e tudo ficaria bem. A dor era intensa, mas nada comparado com o que ela viria a sentir durante anos caso não se livrasse disso. Diante de um espelho ela estava agora, com o peito aberto, seu coracão a vista, com uma lanterna na mão observava e procurava, caso não achasse, nem sabia o que iria fazer. Mas lá estavam elas, bem no centro do seu coracão. Girando como bailarinas de uma caixa de música, cada uma em seu quadro, e a musa de roxo vibrante estava nua e imóvel, onde estaria seu vestido e sua forca para dancar? Afinal ela achava que a forca da musa vinha dos quadros, mas não. Faltava algo. Então ela percebeu que não havia sido a forca das musas dos quadros que haviam dado forca pra musa de roxo no sonho, e sim o contrário. Como ela foi capaz de subestimar tal criatura sobrenatural? Então sentiu uma pontada de tristeza tão grande, ao pensar que havia também sido subestimada tantas vezes, e sem perceber isso deu forca para a musa de roxo (que embora não estivesse mais de roxo, era identificada assim!), e ela comecou a girar, girar, girar. E então, deu pra notar que havia uma linha, um fio bem fino que a ligava a todas musas dos quadros, e ao girar ela comecou a construir um vestido das musas,que se desfaziam a cada giro, em poucos segundos nada sobrou dentro das molduras e a musa estava radiante com seu novo vestido. Agora ela possuia um rosto e era o mesmo da mulher que estava com o peito aberto diante do espelho.

domingo, 7 de março de 2010

Eterno Éden

Ah grandioso, podia , deveria e teria sucesso, caso me levasse pros jardins
do infinito. Tampouco quero sustentar os tijolos dessa construção louca,
acabou o carnaval e ela não pode mais me salvar. Algo raro, ela está longe
e meus sonhos agora estão mais longe do que qualquer coisa.
Gostaria de entender, avaliar de maneira certa o que me impede
de conquistar os reinos da Babilônia, é um caso de cultura ou até
mesmo de inteligência. Imóvel numa gelatina, resistente e grudenta,
realmente não tenho muito o que fazer.
Andamos, distantes e próximos demais pra entender a complexidade dessa
frase, que muito diz e nada significa pra você.
Eu viajo, entre caminhos desconhecidos com pessoas conhecidas e maltratadas
pelos tempos, pessoas e circunstâncias, aprendo que para não ficar assim
devo e mereço distância de tudo o que é considerado de mal gosto.
O certo é incerto e as esperas pela manhã ainda se baseiam em
poucas linhas sem nenhum perfume ou vestígio de coisas recíprocas
que perdurariam por toda semana. Sendo assim, cada dia precisa
de sua fragrância escrita ou isso viraria pesadelo e em vez de sustentar
faria com que minha essência desmoronasse dentro de mim mesma,
causando tais conflitos que me tornariam areia.
Areia límpida, distinta das outras. Única, mas insignificante
diante de você. Você, motivo de meio, de nada ou até mesmo
de todo conteúdo, me fez plantar diante de todas possibilidades,
esperanças pro depois, pro agora e inclusive pro que
nunca poderia acontecer nesse mundo de incógnitas
impostas pelos sonhos possíveis.
Tudo bem, vamos dialogar com nossas almas vazias,
depois de tanto tempo sem esperança,
tentando durante tantos dias chegar a conclusão
que nossos sonhos já nos instruiam sem saber
o quanto faríamos com nossos impulsos.
Azuis ou até mesmo com qualquer chance, vamos
tentar pular os precipícios dos abismos eternos,
me satisfaço somente através da perspectiva
que você criou diante das minhas verdades,
afinal você mesmo sabe, que só te resta isso
de real. Mas desde quando a realidade vale?
Desde nunca, desde nada, ou mesmo o quanto
você queira, você pode até tentar mas isso
será sempre maior que você. Eu sei que
vamos correr além do que as areias do Saara
possam existir e mesmo assim ainda teremos
forças pra arrastar o mundo inteiro pra nossa
intensa depressão interna, existimos de uma
força inexistente, sem deixar rastros por entre
as forças imagináveis da terra, somos inquietos
e quando queremos realmente, nada pode nos
segurar. Tropeçamos mas não podemos
desistir, nada diante dos nossos instintos é válido.
O mundo não existe perto de nós, tanto amor
e tão pouca carne pra sustentar tanto sentimento.
Invisível e mais real do que tudo que se apresenta
diante das púpilas aflitas de quem insiste, pela pulsação eterna,
viver.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Na parede

Ela me olhava do alto, mesmo sabendo que seu lugar era embaixo.Longe de tudo,
vida noturna. Ela não podia estar ali, me olhando ou somente captando minha
presença, coisa que eu não poderia definir ou dizer com maiores detalhes,
apenas com a insegurança do que eu sempre achava.
Disse que meu medo não poderia nunca ser maior que eu, mas eu sentia
medo dela, mesmo de longe, eu via tudo e eu sabia, por mais vago que fosse,
que algo estava acontecendo naquele lugar.
Era sempre assim, quando eu menos esperava, ali estava ela. Parada, ou correndo
com o mesmo medo de mim, sentiamos a mesma coisa, e mal sabiamos
o quanto eramos perigosas uma para a outra. Ilusão. Eu poderia destrui-la
com veneno mas eu tentava me convencer que sua presença era inexistente,
acessório do chão ou um defeito de visão. Essa mancha que surgia, quando
meu quarto não podia mais conter tanta agonia, espaço pequeno demais pra
ficar triste. Por isso eu saia, queria expandir minha tristeza por aí, ou qualquer
sentimento que fosse. Abria a geladeira, nada pra saciar a sede. É sempre assim,
nada cura, nada mata, a sede ou o que seja. O mundo só tende a nos deixar com
a sensação do incompleto. Durante todas essas madrugadas foi assim,
o sono não vem, mas ela, ela sim consegue ficar acordada sem peso.
Ela foi leve pra subir, leve pra cair em mim, me dar um susto, me encher
de raiva e com a mesma facilidade de criar toda essa situação: partir.
Sem deixar rastros de caramujo, sem dizer, sem poder fazer nada tão brusco
a ponto de quebrar suas pequenas asas marrons. Vai embora, some. Antes
que me mate de susto ou antes que eu morra de fome, pois daqui desse quarto
neste instante, não saio mais. Mas abro a janela, pra poder escorrer um pouco de mim pro
quintal, esse quintal que encosta no céu, aqui no horizonte do meu olhar. Se eu
acreditar mais um pouco, eu o toco. Puxo esse véu. Me enfeito de estrelas e
me escondo dela. Inseto maldito que voa. Enquanto isso eu que não posso,
finjo que o poste é lua e que a rua é o céu. Então em cima dele, sentindo
o pulsar do mundo subterraneo, eu deito na rua e espero eles me alcançarem...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

F O M E

Luz vaga. Sumiu a fome, não tinha mais nome, totalmente sem identidade,
não fazia mais diferença, tal doença consumiu. Sumiu. No mundo jamais
havia existido, era uma lembrança rara mas também insignificante.
Ela não tinha cor e desse tal amor, o que havia era tudo que ela
representava, todo cenário onde ela atuava e todas roupas que ela
vestia assumindo papéis coloridos de abril.
Eu ri, diante de tal confissão, coisa que eu já sabia, mal entendia e
buscava, incessantemente, a cada cortina aberta uma descoberta,
uma pessoa coberta com plumas de mentiras. Eu também senti
a necessidade de dizer, que por mais que você tente, e não
sendo vidente, haverá uma razão iminente pra que você
não siga e retorne, no ninho, no meio dos lençois de múltiplos
segredos.
Não há culpa, nem flecha pra acertar uma maçã, no alto da testa,
da cabeça, bem onde o pensamento consegue ser físico e é atingido
e furado, onde se abre uma fenda e todo sentimento escapa,
caindo na terra pra brotar em algum outro lugar, num
futuro incerto. Apesar que o calor é certo, e aquela flor bonita
que nasce, não tem nome também. Mas dessa vez a desarmonia
irá confundir seus ouvidos, como sempre, nunca saberá onde
chegar, a não ser que algo bom seja concedido, uma corda,
uma escada, depende do que você precisar.
Pois é, vimos águias serem arremeçadas contra o chão morno
da chuva matinal, vimos fumaça surgir quando queimaram
uma floricultura que vendia borboletas em aquários de sol,
mas eu não pude ver um sorriso de céu azul enquanto acordava
e tinha que caminhar sozinha, durante longos kilometros, até
encontrar água, que não era veneno, e descansar na sombra
de algum inseto gigante daquele mundo estranho.
Cochilo. Esquilos, não atraz de nozes, mas de algo que eles
pudessem usar pra se aquecer, sozinhos. Não tinham pra onde correr
e assim, senti que algo caiu em mim, um esquilo morto.Torto,
olhos arregalados, com o estomago aberto e um recado escrito
com tinha óleo: Fome.
Não entendi bem, fome do quê?! De tantos os tipos, notei
que eu era nada mais que uma faminta. Tantos tipos
incompletos, joguei o esquilo de lado, pois eu nada podia fazer
a não ser observa-lo com tristeza e nojo de seu sangue
que ainda jorrava do frágil torax dilacerado.
Saciar a fome, buscar um nome, queria ser e achar
dentro do pote de mel algo que por mais que não
fosse comestível, desse a solução, pra uma das fomes,
que ficava em uma das prateleiras, na sessão 79,
provavelmente dificil de alcançar, mas nunca
impossível de matar. Sim, a chave. Estaria no pote,
e depois de lá, teria que encontrar o tão
procurado quarto das prateleiras. Depois disso,
sentiu uma brisa leve, que sussarava: siga o esquilo.
O rastro de sangue, abriu caminho por entre a vegetação
e lá se foi ela achar a solução.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Carnaval

Nada que faça diferença, esperar por mais alguns segundos pode destruir
tanto quanto a certeza de algo que não existe.
Essa dúvida é a prova crucial de que você é intocável, mas ficar brava não
resolve nada. É toda essa repulsão que me coloca no ponto mais alto da
montanha, daqui eu posso te observar e você sabe que não pode fugir.
As coisas às vezes parecem um pouco tristes e isso pode nos deixar
loucos, não ao mesmo tempo pois desde quando nos conhecemos
não somos nem um pouco ordenados, nossos compassos diferentes
preenchem vazios existem nos espaços dos nossos mundos imaginários
e por isso, exatamente por isso, combinamos.
Violada pela esperança de ser, de poder ou de crer em algo que a há
muitos dias se cria, se transforma e se idolatra em minha mente?
Díficil buscar respostas em tais horários, pois se perdem na noite acelerada, as
estrelas são cadentes e meus passos persistem em acreditar que o caminho
não muda. Nunca! Mas muda, e eu não sinto esse gosto amargo porque
meu sonho é muito maior que a ausência, que o ocupado que apita
e anula a minha audição. Mas não, eu continuo a persistir, mesmo quando
a pedra cai nas minhas costas e amassa minhas costelas, eu posso
continuar enquanto eu souber que você existe aí, eu existindo aqui
é quase a mesma coisa, sabemos, não é mesmo?!
Agora só me falta ver o silêncio...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Grisalha

Com o céu assim as pessoas ficam até meio bobas, sem reação. Ao abrir a janela, ou não,
álias, melhor: ao espiar pela fresta da janela, onde a madeira já estava apodrecida e frouxa
de tão velha, ela se deparou mais uma vez com seu quintal triste.
A manhã não seria de tudo diferente, talvez enchesse as pêras colhidas de tédio
durante a tarde mas tudo bem, era exatamente assim que ao final do dia ela
suspiraria e agradeceria, até mesmo pelo que a entristecia um pouquinho.
Estava tudo meio programado, e a luz que entrava em sua casa ela já sabia
de cor onde bateria e em qual segundo do dia. Era tudo tão seu, assim como seu corpo
ao vento, ao relento, na chuva daquele quintal triste.
Todas as coisas interagindo de forma sutil. É aqui, exatamente aqui e para todo sempre.
Enfim ela se levantou, se postou diante das flores não aguadas, esquecidas durante uma noite
que passou se atormentando com qualquer coisa que lhe parecesse medonha, isso era resultado
de um filme de terror que a fez pensar mal até dos feijões verdes que estavam numa sacola amarela pálida.
Não adianta muito mas aguou com seu copo de água, que ficava do lado da camam, todos
os dias. Deixou sobrar um pouco para que pudesse umedecer a boca seca, sentou no peitoril
e se contentou com o sol pelo resto das três horas seguintes...
Mente vazia e corpo leve. Era assim que ela iria embora, mais uma vez!

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Telefone.


As vezes não dá pra compor algo bonito no desespero. E o fato foi que eu não tirei
os olhos da janela, a porta pra sua vinda, a fuga da minha noite. Tudo que eu esperava
em delírio constante de encontrar aquelas horas voluptosas.
Diante da impossibilidade, do conflito e impedimento constante meu sono foi roubado,
e o calor da noite triste me invadiu por completo e queimou toda esperança de ter
mais uma lembrança inusitada.
Infelizmente foi assim, eu estava na torre, cercada por espinhos enquanto você
em sua urgência de me ver não se importava com os ponteiros aflitos e me procurava
incessantemente.
Eu tentei,minha vontade era sair correndo, mas como? Nem sempre essa seria a solução,
então eu definhava, queria saber o que seria dito, queria sentir as palavras mornas
sendo refletidas em mim, mas querer foi pouco, eu não desafiei. Não fui além e por
isso perdi um pouco de mim e dessa vez não foi em você, foi ao vento. Minhas cinzas
cálidas, cálidas e eu calada, silêncio que me encomoda enquanto eu sei que você pensava
a mesma coisa.
Da torre eu via um mundo gris, eu própria perdi minha cor. O monstro da minha noite
eu ilustro como uma águia, desenhei em guache pois essa águia tinha cores pálidas,
de tristeza e descontentamento. Sinto que foi a maneira de nos igualarmos, me tornar
imensamente infeliz seria a solução pro seu sono sem graça e sem sentido.
Estava tudo certo, só minha posição no mapa estava errada, sim, eu não dormi,
mas não era em meu quarto que meu corpo estava destinado a se encontrar,
eu jazia nos lençois vermelhos, eu era um oceano. Eu batia fortemente contra a barreira
imposta, eu tinha que invadir a cidade, passar pelas ruas, devastar tudo o que estivesse
em meu caminho simplesmente porque me impediram de fluir. Mas não, eu me contentei,
antes que a águia me arrancasse os olhos, os sentidos.
Da torre eu observada o mundo inerte, sem graça, sem movimento. Não havia som,
e nesse instante a lua desapareceu pois não havia mais sentido pra permanecer...

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Coração Abajur [3]

Assim começa a saga da menina sem seu coração abajur,que lentamente se ajoelha ao lado de sua cama e a empurra com a pouca força que lhe resta, então como se fosse uma mágica um alçapão
surge, ela o levanta e entra. Mas não era mágica e sim uma artimanha de seu coração
abajur, que mesmo longe exercia uma influência enorme para que as coisas, por piores
que parecessem, dessem certo de alguma forma.
Confusa e apenas seguindo ordens invisíveis, ela se deparou numa sala muito bonita,
com carpete vermelho gritante, bem no meio dele havia uma escada em espiral e
nada mais, as pareces eram de madeira e no teto havia um lindíssimo lustre também
em espiral.
A menina estava com medo, então tirou um dos brincos que usava e o jogou, não
conseguiu ouvir o barulho dele chegando ao chão então deduziu que era uma escada
quase eterna, desanimada pensou que seria exatamente esse o tempo que ela
levaria até recupera-lo, mas começou a descer a escadar, afinal era a única opção
que havia naquela sala.
Algo que ela desconhecia era que ao começar a descer e não poder visualizar mais a sala,
esta como uma flor se fechou, as madeiras da parede se descolaram e se juntaram ao carpete,
e a escada ficou a pairar num céu estrelado. Nada mais existia em volta, e ela já não percebia
que agora fazia parte deste mundo em espiral também.
A menina descia, descia para uma luz, já não sentia medo, e borboletas surgiam por todos
os lados, inclusive pousando em seus cabelos, em seu pijama. Já não se sentia fraca.
Começaram a surgir janelas que pairavam numa escuridão sem fim. Janelas que mostravam diversos mundos paralelos. Em qual delas entrar?! Em qual delas procurar meu coração abajur?!
Ela se indagava, mas não havia nenhuma resposta dentro de sua mente, apenas o barulho do
vento, o ronronar de um gato e um assobio de um calau louco. Estava se sentindo vazia, e todas imagens e som interagiam com ela de uma forma única. Mas não era um vazio triste, era um vazio composto de diversas oportunidades.
Mal notou e pulou da escada em espiral, não iria entrar em nenhuma janela, não faria o óbvio,
o sensato ou aceitável. Logo viu seu brinco pairando no ar, sendo admirado por cinco borboletas amarelas, ela jamais ouviria o som dele, pois ali não havia limites, não haveria nunca um chão,
a não ser que você esperasse por um.
Então foi percebendo que algumas formas iam aparecendo ao redor, ela havia chegado em algum
lugar, haviam muitas pedras, muitas árvores e alguns templos gregos sendo reconstruídos.
Era tudo muito natural, e naturalmente ela não se sentia só. Cansada de cair, finalmente
chegou em algum lugar e o alívio que isso causou a fez sorrir para as ameixas.
Se por acaso seu coração estivesse por ali, enfeitando esse lugar já dotado de belezas inimagináveis, ela ficaria agradecida por ele ter fugido e a guiado para um lugar tão
bonito. Ficaria com ele por ali, até que ele sumisse de novo, para ela procurá-lo e sempre
se deparar com lugares melhores. A menina apesar da imensa alegria não sentia a presença
dele, o procurou incessantemente e nada...
Perto do templo destruído que ficava na parte plana, ela encontrou uma cachoeira e ficou
por ali, enquanto tentava assimilar tudo que havia acontecido pela manhã até chegar
naquela ilha desconhecida, devia ser uma ilha, ou não?! Jamais saberia.
Baco, o dono desta nova ilha no mundo em espiral, a observava, curioso e ao mesmo
tempo animado com a descoberta dessa garota.
Ele havia a conduzido para sua ilha, ao perceber que cansada e sob influência de qualquer força,
após ter saltado da escada em espiral,ela poderia ser levada como uma folha. Apaixonado,
desde então, precisava descobrir o "por quê" de tudo isso. Ele estava disposto a fazer
qualquer coisa por ela.
Ela escutou folhas sendo amassadas atras de si, e se virou, então viu Baco e tudo parou.
Longe, bem distante, o coração se acendeu e começou a bater muito forte, causando
o desmoronamento de mais da metade da casa subterrânea do duende, que apavorado correu
para perto do coração abajur, o único lugar aparentemente seguro. Estava decidido,
precisava se livrar desse objeto mas estava com medo de tocá-lo. Não entendia o porquê
da revolta de um objeto, ou talvez de sua felicidade, afinal ele estava radiante novamente,
porém mais letal que nunca.
Enquanto isso, a menina petrificada diante de Baco, que em pleno meio dia, reluzia
e com seus cachos amendoados se tornava ainda mais atraente, sua pele alva, seus
lábios levemente rosados e seus olhos azuis, alimentavam a imaginação da menina
para os mais doces devaneios. Num segundo momento sublime, ela sorriu.


(...)

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Coração Abajur [2]

(...)

Mal pode acreditar ao notar que seu criado mudo estava vazio, sem luz,
sem seu coração abajur. Desesperada desmaiou, voltando para o mundo
paralelo onde pensava viver coisas boas.
Rapidamente retornou, com a visão ainda turva começou a entender
os traços de seu quarto escuro. Escuro até quando?!
Enquanto isso o duende estava adormecido depois de se deixar
levar pelos deliciosos instantes que o coração abajur lhe
proporcionava, aquela luz e a pulsação o acalmavam como
uma canção de ninar. Mas o coração abajur já não estava radiante
mas sim com um brilho doente e batidas barulhentas e atormentadas.
Com isso o duende acordou nervoso de seus pesadelos comumente
desagradáveis. Tão acostumado a desgraça, com um segundo de doçura
ficou mal acostumado, como se tivesse vivido sempre de sonhos
e pela primeira tivesse encontrado a tortura da miséria de seu subterrâneo.
No que havia transformado aquele belo objeto de sua afeição?! Teria se
adaptado? Ou apenas se revoltado com a ausência de... de algo que ele
não sabia mais o que era, nem se lembrava onde havia pegado aquele,
agora, incomodo pulsante.
Não sabendo o que fazer, pensou em simplesmente jogá-lo fora pois já
que não sabia como jogar a própria vida , jogava tudo que o atormentava
um pouco. Ao tentar se aproximar foi atirado longe, no meio de vários
abacaxi que cortaram sua dura pele, devido a intensidade da queda.
Aquelas mãos sujas jamais tocariam o coração abajur, e isso ele
pode evitar, indignando o duende que pensava que podia tudo.
Na diagonal, há milhares e milhares de lhamas de distâncias, a menina
de coração roubado sentiu seu coração fisga-la, como um peixe em movimento
que preso ao anzol permanece conectado até finalmente rasgar e se libertar
deixando um insignificante rastro de sangue. A menina começou
a andar em direção ao nada, fraca e com a mão no peito que há tempos
não emitia nenhum som. Apesar disso ela levava uma certeza com ela:
iria recuperar seu coração abajur!


Continua(...)

domingo, 3 de janeiro de 2010

Coração Abajur

As 15:57 da tarde com a porta meio aberta, a luz penetrando pelas frestas da janela.
As cortinas claras, rosas ou escuras balançavam de leve acompanhando as
batidas de luz de seu coração abajur. A tal adormecida o havia retirado após
deixar que fosse consumido por completo, nada restava em seu interior além
dessa estranha luz avermelhada e fluorescente.
Desde então durante todas noites ela realizava o mesmo ritual para que
este coração abajur não se resfriasse nem desistisse, por fim, de brilhar.
Era um consolo vê-lo no criado mudo da cama, uma companhia única
que possuia ao se perder em devaneios noturnos. Porém ele, um duende
de calças curtas amarelas, que segurava um abacaxi a observava pela
porta, aquela meio aberta do começo do texto e aí que tudo se complica
pois ele fascinado pela luz do coração abajur, olhou tristonho para seu
abacaxi: este me machuca a palma das mãos e não possui uma luz assim
portanto não o quero mais!
Se julgando muito esperto entrou no quarto na ponta de seus pés
imaginários, dotados de uma rapidez incontrolável e inalcançável
até então. Começou a passar a mão em volta do coração abajur ,
sem encostar, uns quatro centímetros de distância, parecia
estar massageando o ar que estava em volta, hipnotizado pelo
orgão que pulsava brilhante diante de si. Mas ao recobrar sua
consciência egoísta o pegou sem ao menos se importar com
o valor que lhe atribuiam, sem pensar na menina adormecida
e toda consequência disso.
Saiu do quarto num passo rápido, e este passo foi um mundo
e o mundo não era nada. Levou o coração abajur para além
da terra, passou por árvores em espirais infinitas,
casas, um mundo em espiral, onde quem não fosse atento
ficaria tonto rápido e seria persuadido a fazer qualquer
coisa que o destruisse.
Embaixo desse mundo morava o duende,um lugar sem luz,
com retratos de ratos pelas paredes, cadeiras de insetos
gigantes, copos de chapéus de seda bordados com calendários
do ano chinês. Haviam muitos abacaxis, por todos lados, um sofá
triste no lado esquerdo, perto de uma janela de pedra, pela qual
não se via nada, nem se podia sonhar com as estrelas.
Mas o que importava naquele cenário imundo além do coração abajur?
Enquanto houvesse graça, era isso que importava , enquanto
pulsava, enquanto houvesse luz. O que o duende não sabia era
que longe da tal dona, o coração abajur perderia sua luz,
afinal a alegria e contentamento dela o mantinha aceso
e pulsante. Enquanto isso, ele o colocou no alto de uma estante
a fim de iluminar todo o quarto sombrio e sem graça,
sentou numa poltrona de retalhos e ficou satisfeito observando.
Do outro lado dos mundos em espiral, acordava uma menina
num sobressalto, como se faltasse ar, talvez fosse um pesadelo
horrível, realmente seria, assim que ela desse conta de que
lhe haviam furtado o coração abajur.

(...) continua!