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quarta-feira, 12 de maio de 2010

E o fim?

Isso, não tenho nada a dizer definitivamente nada. Entretanto estou dizendo
tudo que está contido dentro de um silencioso "nada".
Pensar em "nada" faz com que eu visualize um vácuo, uma eternidade,exatamente isso: o próprio infinito,dito e materializado.
Porém isso nos engole, isso acaba com o mundo inteiro que circula
em partículas minúsculas ao redor de nossa mente, logo o "nada"
supostamente vazio, trás várias coisas inquietantes que de vazias
não tem nada, mas de esvaziadoras tem tudo.
O nada reside numa extreminade alerta, ao abrir a porta poderemos encarar o infinito no limiar, assim, de olhos esbugalhados, indignado com tudo que o nada
te suga, te reprime e te esvazia, sem dó nem piedade.
Pronto, eu situei o "nada" num contexto e percebi que numa
carta vazia, tem muito mais escrito do que em mil volumes daqueles livros extensos.
Tudo bem, compreendo também que o "nada" está carregado de palavras invisíveis,aquelas ainda não traduzidas e também aquelas impossíveis de compreender.
O "nada" vem escrito num pergaminho com a descrição da morte, sim, ninguém nunca vai saber ao certo, mas quem sentiu provavelmente entregaria umacarta "vazia".
Vazia que nada, cheia de nada escrito, cheia daquilo que ninguém entende, e nem por isso é vazia, não é nada, é tudo.
Esse limiar que é quase nada, o nada e o tudo estão quase se fundindo e ninguém nota, ninguém anota os passos delinquentes que esse limiar devia dar por aí, então enfim, o nada e tudo formariam algo:________.
Isso que não se tem nome, não existe diante dos seus olhos, dos olhos da multidão humana, que grita em protesto por uma explicação.
Mas quando chegar o momento, eu vou explicar detalhadamente,
vou distribuir por aí mil cartazes em branco, e ai de quem
disser que eu não escrevi nada, que eu proclamei o vazio
em suas paredes pulverizadas da camada fina de chuva que caiu
ontem a noite e ainda não secou.
O que você não vê, certamente existe em algum lugar, dentro de algum quarto branco, e poderíamos até supor que ele está vazio, solitário,e obstinado em ser, existir. Enfim, queremos qualquer coisa para que possamos nomear e publicar por aí, eis O QUE É, O QUE TEM NOME, O QUE EU CONHEÇO. Mas não conhece nada, não sabe de nada, e isso é tudo.
Então depois de horas pensando, desde que o sol arrancou a janela
do meu quarto e me obrigou a acordar até agora, eis que cheguei
numa conclusão: Não há conclusão. Nunca haverá e essa será minha eterna prerrogativa, jamais terminará.
Por isso que do nada, eu vejo o infinito, só preciso abrir a porta
para observar , nem se eu tivesse mil braços ou milhões eu alcançaria o fim, nem assim, nem daquele jeito e nem do outro.
Por isso, só e exatamente, eu continuo sem nada a dizer,
se ao menos eu conseguisse expor de outra forma, mas a forma ainda não existe, não assim, nesse mundo, desse jeito ou daquele jeito.
Na verdade eu começo a crer que nada existe, pois nada alcanço,
logo tudo faria parte do infinito, que fica no limiar com o nada,
isso é tudo. E o fim?

terça-feira, 4 de maio de 2010

Primavera


Emperrada na nascente florida onde ela guarda as
mágoas amadas. Assim estava Marga.
Não começou ali, mas certamente foi ali que foi visto,
pobre ser sem identidade moral, carregando duas
pedras, pedras que desceriam garganta abaixo
afim de conter algo,talvez de preveni-lo contra a realidade
que fazia com que ele se odiasse cada vez mais.
Difícil de compreender a identidade da alma, quando
essa mesma não quer ser entendida.
Yan descia a rua de sua casa, certo de que no fim
seria punido por algo que naturalmente ele teria
feito, mais uma vez estaria arrependido, porém
jamais estaria convicto de que não o faria de novo,
seja qual fosse a punição, nem que fosse cada vez
mais severa.
O importante era ser desculpado, para logo poder
pecar novamente e assim, nesse rosário concluir
uma procissão inteira de dores.
Marga o observava, ali, no limiar do seu sonho
e também do seu pesadelo. Ela nada podia evitar,
pois afinal, a culpa era dele, de toda essa
imaginável situação.
Ao mesmo tempo se sentia incompleta, ele fazia
parte do seu processo evolutivo nesse plano confuso,
ele era o reflexo dos seus sonhos inacabados, ele
era o pesadelo que ela não vencia, cujo desafio
era sempre maior que o propósito da luta.
Correu em sua direção, Marga correu tudo que pode
e enfim o parou, afobada e quase sem ar.
__Yan, você sabe muito bem aonde ir,sempre soube.
Como encerrar um caminho percorrido por tantos
dias?! Eu posso te contar a nova versão
dessa história, cujo fim eu acabei de inventar.
Yan parou, se indagava mil vezes, mil perguntas,
mil sinos tocam e uma única Marga, pálida e
invernosa, seu casaco azul estava salpicado
de neve, onde estaria Marga nesse verão?!
Da onde surgiu e em que tempo habitava?!
Queria entender se não estaria delirando,
se estaria finalmente temeroso de sua punição
e convencido de que jamais pecaria, pararia
de vez ou seria arrastado para o mundo
gelado de Marga?! Sim. Finalmente.
Yan nada disse, nada verbal, aquiesceu
lentamente e uma lágrima rolou de seu
olho esquerdo, seu único olho humano.
Nesse instante seu olho de vidro trincou,
e escorreu o que podemos considerar
como sendo uma lágrima de sangue.
Marga observava tudo em silêncio, seria essa
a noite em que estaria completa? A noite
em que salvaria Yan de seu pecado, seu mito.
Yan colocou as pedras no chão,deu sua mão para Marga,
a mão dela estava fria, frágil. Então disse algumas
palavras que soaram como uma ofensa para Marga:
__Não entendo. Está verão e seu casaco está
cheio de neve. De que diabos de lugar você veio?
Ele não entendia.Ainda não. Ela refletiu
bastante antes de responder, soltou a mão de Yan,
que a olhava assustado:
__Você vive o verão pois ignora o inverno.Não
importa o quão gelado esteja o mundo, você
simplesmente não se importa, despreza os flocos
de neve que caem diante do seu nariz, afinal
o que importa é você fazer o que você quer.
Mas afinal, quer ou não conhecer a verdade?
Por alguns segundos Yan se sentiu seguro o suficiente para
revidar a resposta de Marga, porém parou, ele não
sabia o porquê de tudo aquilo, do mesmo caminho sendo
percorrido, da mesma sensação de glória ao ser excluso
do erro e disse:
__Eu já posso sentir o frio.
Marga ficou mais aliviada, ele aceitou segui-la de uma
forma singela. O destino seria o bosque, a solução
seria encontrada, ele não mais pecaria, ela não
mais estaria condenada a nascente florida,
a questão era escrever nas notas, rodapés,
nas paredes, nas flores. Seriam distribuidos
recados por todos os lados, as letras formariam
cirandas e mais cirandas, após isso eles deviam
apenas ler, em voz alta, invocar o final tão
desejado e por fim vivê-lo, transformado e digno.
Quem sabe dessa forma a primavera pudesse enfim chegar.